Entendimento para aceitar quem somos aqui e no contexto universal

.:. por Fernando Luigi .:.

Basta apenas aceitação. Aceitação!

É assim que posso concluir o que vivi durante um sonho nesta noite já madrugada do dia três de setembro do ano de dois mil e treze.
Eram passadas as três horas e quarenta minutos já neste dia três. Tenho uma certa fixação em conferir os horários em que acordo no meio da noite, porque há tempos que desperto entre três horas e quatorze minutos e três horas e dezenove minutos. Coincidências? Pode ser, mas é estranho, não é?
Acordei mais uma vez em prantos e triste com a história vivida, mas logo me vem o consolo de que há explicações, pelo menos para mim.

O cenário mudava de ensolarado para macabro, e terminou mais triste do que eu sentia naquele momento. 
Era eu o protagonista, mas ao mesmo tempo não era eu, pois eu dirigia os demais atores e a mim mesmo. Como num filme, num palco, mas parecia real. Sentia a realidade dos fatos, porém, minha pele não sentia a brisa, a água do mar (ou rio?) fria ou quente.
Muitos personagens me confundiram com suas identidades. Ora eram parentes, ora eram estranhos, mas todos queriam me dizer algo que eu procurava mas não sabia ainda o que era. Haviam detalhes no cenário que me fizeram sentir que a casa era requintada, iluminada, e as vestes das pessoas eram de fino trato, grife, coloridas.

Parecia que era uma festa o local em que fui colocado neste sonho. Muitas vozes, tilintar de talheres e pratos. Na varanda podia ver o mar ou rio, de águas correntes como que saindo de um canal e desbocando em lugar mais aberto. O sentido era da esquerda para a direita, e a agitação das águas era percebida pela marola formada. Do outro lado eu vi uma outra casa com varanda, apenas as luzes da varanda estavam acesas. Logo abaixo da mureta da varanda, rochas que formavam um quebra-mar. A agitação das águas batendo nessas rochas invadiam a mureta dessa varanda. 

Posturalmente em pé e observando toda essa agitação das águas, de repente as vozes dentro da casa em que estava, tomaram volume e nervosismo. Uma criança caiu naquelas águas agitadas e eu saltei imediatamente para salvar. Nadando em direção à criança logo percebi de que não estava sozinho. Na minha esquerda uma mulher adulta que entre braçadas angustiantes tinha ainda fôlego para gritar para a criança não se desesperar. Na minha direita vejo uma outra criança nadando bem ao meu lado, quieta. Conseguimos capturar a criança e chegar na outra margem, onde já não haviam mais aquelas rochas, agora era areia úmida. Eu estava exausto, e tinha a criança abraçada ao meu corpo. 

Estávamos então os quatro nadadores olhando a margem de origem vendo o casarão, muita gente na varanda e gritando em desespero. Com o braço direito eu acenava dizendo que estava tudo sob controle. Abracei a mulher e a outra menina, e juntos sem emitir uma só palavra nos olhamos, sorrimos, e veio a sensação de alívio. Ali na minha frente estavam as três vidas desta cena estavam com roupas brancas e secas, e naquela quase escuridão de noite sem luar, águas agitadas, pude ver uma luz irradiante envolvendo cada um dos corpos miúdos quando as luzes da varanda da casa apagaram-se. Sorriso angelical, e eu ainda me sentia cansado e molhado. Por que estaria eu em situação diferente à deles?

Ouvi motores, dois ou três, eram barcos se aproximando de nós para salvatagem. Senti novamente alívio acalentador. Mas, de repente a cena mudou, e cá estou do lado da margem aonde tudo começou vendo o resgate. Vejo meu corpo sendo colocado dentro da embarcação, só, e mais ninguém. Olhei para os lados e as pessoas choravam em desespero, num lamento de perdas. Busquei logo um diálogo para entender o que estava acontecendo. Em vão. Ninguém respondia, ninguém ouvia o que eu dizia, parecia que eu não estava lá. E não estava mais.
Ajoelhei-me próximo à mureta, fiquei observando as águas agitadas, a noite escura, e o meu corpo sendo transportado para esta casa.

Até aí eu podia lembrar que antes disso tudo, eu havia conversado com uma senhora loira, com cabelos penteados tipo realeza imperial, dentro de um vestido dourado e rendas brancas abandando-se com um leque branco. Então deduzi que até aquele momento eu tinha reciprocidade, diálogo. Ou não?

Não vi mais o meu corpo dentro daquele barco. As pessoas continuaram a noite que parecia de festa ou um sarau, pois eu podia ouvir um piano e violino tocando ao fundo. Os homens do barco seguiram para uma rua atrás do casarão, cabisbaixos e lamentando o fato.

Caminhando pela casa buscando explicações, assustei-me diante de uma porta branca de madeira com janelas de vidro, quando vi o reflexo das pessoas da casa e eu não via o meu próprio reflexo, apenas uma aura, um contorno de luz, disforme, aumentando e diminuindo de intensidade. Vi no canto direito do reflexo que aquela senhora loira se aproximava de mim com um largo sorriso nos lábios, e abanando o leque. Ficou diante de mim, fitou seus olhos nos meus e pediu para que eu a acompanhasse. Num determinado momento a caminho desse lugar que ela queria me mostrar, ela parou e perguntou para mim se eu estaria pronto para enfrentar uma nova realidade. Que realidade seria esta, perguntei-me mentalmente. Sentindo que não havia mais nada a esperar naquela longa noite, apontou para um canto de uma sala enorme de paredes altas pintadas a óleo num amarelo dourado e detalhes brancos nas molduras do teto, da luminária central e no contorno de portas e janelas do casarão. Lá estavam as três vidas que até pouco tempo atrás estavam abraçadas a mim dou outro lado da margem.

Agora sim tenho que relatar a face cruel desta história, sonho, pesadelo, ou sei lá o que foi. Eram minha filha Camila, minha neta Natália e meu neto Luan. Escrevo neste momento de forma emocionada, em lágrimas e sentimento de perdas.
Morte, desencarne, projeção, aviso, ou simplesmente desligados da vida terrena. O detalhe mais curioso ainda é que eu não via formas como na vida terrena, até então. Por um lado eu me esforçava para dar forma, cor e estética, mas me vinham imagens que eu não conseguia identificar até que uma voz esclareceu que se tratavam das minhas sementinhas.

Tomamos uma forma diferente e começamos a ver muitos e muitos outros seres com a mesma forma e cor, no meio das pessoas daquele casarão ainda vivendo este plano de vida.

Decolamos rumo ao infinito ainda escuro e lá vimos mais e mais seres comuns a nós, mesma forma e cor. O universo é assim, disse uma voz atrás de mim. Disse também que eu poderia então revelar-me e textualizar que a mensagem dessa passagem é simples e menos complexa tal qual tentam ainda nos convencer de que para explicarmos a nossa existência qualquer que seja o plano e forma de vida, é preciso um ser superior idolatrado cheio de regras e leis criadas por nós mesmos, incrível isso.

O universo é compactado com esses seres que tornam-se vida como mutantes adaptando-se a ambientes já preparados por nós mesmos. Tudo o que queremos e pedimos, vem.

Somos enquanto matéria, o reflexo como num espelho, pois o que registramos na mente em campo secreto e sagrado, nunca se apagará. Podemos mudar rumos, mas não podemos deixar de aceitar o que somos aqui, lá, ou além do que imaginamos.

Não se trata se ateísmo da minha parte, mas sim de compreensão, uma nova leitura do que temos de fato e real.

Para aliviar ainda mais este momento, já obtive notícias de minhas filhas e netos. Todos muito bem, assim como eu quero e peço todos os dias em pensamento.

Basta apenas aceitação. Aceitação!